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Escassez hídrica abala receita de empresas de saneamento em SP

Uma nova leva de municípios no interior de São Paulo deve decretar situação de emergência por escassez hídrica e também adotar racionamento de água nos próximos dias. As medidas devem ganhar fôlego passadas as eleições e por conta da proximidade da publicação da resolução da Agência Nacional das Águas (ANA) e do Departamento Nacional de Água e Energia Elétrica (DAEE) que determina a redução da captação de água para diferentes fins por diversos municípios que integram as bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ). O decreto é importante porque, entre outros aspectos, permite a aplicação de uma tarifa de contingenciamento, ou seja, um reajuste tarifário emergencial. Empresas de saneamento ouvidas pelo Valor afirmam registrar recuo de dois dígitos nas receitas neste ano em função da redução do consumo e aumento dos custos com produtos químicos para tratar a água.
A expectativa de especialistas de saneamento da região do PCJ é que a resolução seja publicada no dia 1 de novembro. Pelas regras, vai ser reduzida de 20% a 30% a captação atual de residências, indústria e irrigação nos rios do PCJ, o que deve levar alguns municípios a realizar racionamento e a decretar situação de emergência por escassez hídrica.
A ANA afirmou que se reuniu no início do mês com os municípios da bacia e pediu contribuições sobre a forma na qual se deve dar a redução nas captações. A agência diz ter recebido mais de cem sugestões, mas não confirmou a data em que serão anunciadas as medidas. Antes, será realizada uma nova rodada de encontros, nos quais serão discutidas as regras finais.
O reajuste, embora impopular, é visto como importante para as empresas do setor em um momento em que os custos de operação ficaram mais altos e houve queda de receita. Os gastos maiores referem-se à baixa qualidade da água por conta da seca. Além disso, as empresas relatam gastos maiores de bombeamento, com contas mais salgadas de energia elétrica, já que está mais difícil captar a água. E ao mesmo tempo elas vivem diminuição de receitas pela retração do consumo de água por haver cada vez maior conscientização e descontos nas faturas para o consumidor.
No total, 11 dos 45 municípios da região regulada pela agência Ares PCJ já decretaram situação de emergência por escassez hídrica: Cosmópolis; Valinhos; Vinhedo; São Pedro; Cordeirópolis; Rio das Pedras; Salto; Iracemápolis; Nova Odessa; Araras; Saltinho. Espera-se nesta semana o decreto de outras cidades, como Americana.
De acordo com o diretor-geral da Ares PCJ, Dalto Brochi, a ideia por enquanto, no entanto, é buscar alternativas ao reajuste tarifário. A Ares PCJ tem sugerido a busca coletiva por redução de impostos. A ideia é que com a desoneração sejam reduzidos os custos de operação das empresas, e isso equilibre melhor as contas, sem haver aumento das receitas via tarifa maior.
Entre as propostas que os municípios da região devem encaminhar em breve aos governos de São Paulo e federal estão: isenção de ICMS sobre energia elétrica e produtos químicos e isenção de PIS e Cofins. Semana passada representantes do consórcio se reuniram com o DAEE paulista para tratar do assunto.
Brochi cita que, embora as tarifas de água no país sejam baixas em relação às tarifas aplicadas em outros locais, como Estados Unidos, Portugal e Espanha, o aumento tarifário penalizaria o consumidor duplamente: pela escassez de água e por uma água mais cara.
Aumentar a receita por meio de uma tarifa de contingenciamento seria uma medida prevista na Lei de Saneamento, explica Brochi. Mas ele diz que, além do município, é preciso o decreto do Estado indicando situação de emergência por escassez hídrica.
O Consórcio PCJ lembra que desde janeiro tem chovido, mês a mês, ao redor de 70% da média histórica nas três bacias. No planejamento feito no começo deste ano, a expectativa era que o Sistema Cantareira – alimentado em parte pelas águas das três bacias – chegasse a novembro com 15% de volume útil, em conta sem o volume morto, hoje em sua segunda cota. “Isso levou a uma orientação à população para que diminuísse o consumo, que caiu de forma drástica”, afirma Francisco Lahóz, secretário-executivo do consócio.
Nas contas do PCJ a redução no consumo entre os municípios atendidos neste ano variou entre 20% e 60%. “Em toda a bacia foi verificada essa diminuição. Seja por menor bombeamento, seja pela população que utilizou menos água. E quando você reduz o consumo, deixa de ter receita”, diz Francisco Lahóz.
No interior de SP, há empresas privadas que operam no saneamento por meio de concessões e há também autarquias municipais. No caso das autarquias, como não visam o lucro, seu colchão para usar em momentos de crise é muito pequeno, havendo uma situação ainda mais delicada neste momento. Em média, diz Brochi, as empresas já estão vendo os custos subirem até 20%, enquanto relatam queda de receita de até 30% em relação à média mensal que observavam antes da crise hídrica.
O Daev de Valinhos, autarquia de saneamento da cidade a 82 quilômetros de São Paulo, está utilizando parte da economia feita para investimentos nos últimos dois anos para sanar a queda de cerca de 20% na arrecadação observada neste ano. De acordo com Luiz Mayr Neto, presidente da autarquia, está em estudo um aumento na tarifa de água para a população nas próximas semanas. “Vamos esperar para ver o quanto vai chover agora. Com base nisso vamos decidir qual será o tamanho do repasse na conta”, diz. A paulista Valinhos está em racionamento desde o começo de fevereiro.
“Está todo mundo arrecadando menos por conta da crise”, relata Fabiane Santiago, superintendente da SAAE, autarquia municipal de Atibaia para saneamento. A SAAE capta água no rio Atibaia, mas diminuiu recentemente em 30% a captação com a economia que a população da cidade vem fazendo. O rio está, segundo ela, um metro abaixo do seu nível normal.
A partir de novembro, com a possível restrição de captação de água pela nova resolução da ANA e DAEE, provavelmente Atibaia vai ter que implantar um rodízio, segundo Fabiane. Ela explica que a SAAE estuda a alternativa de um tipo de racionamento por cota de consumo. A SAAE estabeleceria, por exemplo, quantos metros cúbicos cada faixa de consumidor teria a receber e o que excedesse esse consumo seria sobretaxado, para forçar a economia da água. Essa alternativa, ela diz, seria melhor do que o rodízio tradicional, de fechar e abrir reservatório, pois este traria um ônus muito grande de manutenção.
“Isso porque quando a água está passando pela tubulação e está pressurizada, tem partícula que fica presa na tubulação. Mas quando se tira essa água e essa pressão, essa partícula cai, e quando a água volta, essa partícula sai na água. Ao abrir a torneira, a população vai deixar a água suja cair, até que possa volta a consumir novamente”, afirma Fabiane Santiago.
Além desse desperdício, o rodízio tradicional leva à entrada de ar na tubulação que precisa ser corrigido para que ela volte a funcionar dentro da normalidade, o que aumenta os custos de operação do sistema.
A falta d’água e o impacto negativo nas empresas de saneamento paulista não se restringem à bacia do PCJ. Em Itu, uma das cidades com situação mais grave de escassez hídrica no Estado, a Águas de Itu registrou recuo de cerca de 40% no consumo de água nos últimos doze meses.
Para atenuar a consequente queda na arrecadação, a direção da empresa de saneamento teve que recorrer a aporte dos acionistas para fechar as contas e manter os investimentos necessários e as ações emergenciais. Semana passada, Itu teve que contratar 20 caminhões-pipa para atender parte da população.
Fonte e Agradecimentos: VALOR ECONÔMICO
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