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“A água precisa sempre ser tratada como prioridade”, diz cientista político

O canadense Ryan Hreljac, 25, tinha seis anos quando percebeu que o mundo não era igualitário. Ele escutou de uma professora que crianças de outros lugares andavam cinco quilômetros para buscar água. Ao pensar que, para ele, bastavam dez passos até o bebedouro mais próximo, o garoto decidiu fazer alguma coisa. Ao mobilizar sua rede de conhecidos, Ryan arrecadou o suficiente para construir seu primeiro poço artesiano em uma escola de Uganda, no leste da África. Quase 20 anos depois, a Ryan’s Well Foundation colaborou com mais de 650 escolas em 30 países, ajudou em 749 projetos de água potável e garantiu melhores condições de vida a cerca de 790 000 pessoas. No mês que vem, Ryan estará no Brasil para o VIII Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, realizado em Curitiba, no Paraná, entre os dias 21 a 25 de setembro. Em entrevista exclusiva ao site de VEJA, o cientista político em desenvolvimento internacional falou sobre dificuldades e motivações para mudar o mundo.

Qual foi a primeira dificuldade que você enfrentou? No começo, supus que meus pais simplesmente me dariam o dinheiro ao perceber a minha virtude por uma causa nobre. Porém, a primeira reação deles foi a de me ignorar. Crianças normalmente se esquecem de seus planos mirabolantes, mas fui persistente. Chegou a um ponto, durante um jantar de família, que apontei o dedo na direção da minha mãe, de modo grosseiro, e disse “alguém acabou de morrer porque você não quis ajudar”. Fiquei de castigo, mas depois eles cederam com uma quantia inicial de 70 dólares e falaram que eu precisava trabalhar para ter o restante.

De que forma a infância o ajudou a seguir em frente? Com 6 anos, assim como qualquer criança, eu era muito ingênuo e não sabia como o mundo funcionava. Achava que 70 dólares resolveriam todos os problemas do mundo. Ao mesmo tempo, a atitude ingênua e otimista me fez continuar. Se fosse com a visão adulta, eu provavelmente teria desistido no momento em que percebesse as dificuldades. Fui impulsionado pelo objetivo de provar que meus pais estavam errados e que eu conseguiria realizar meu sonho.

E qual foi a primeira frustração? Conforme fiquei mais velho, descobri que nem todos os adultos fazem do mundo um lugar melhor. Na infância, temos aquele sonho de superheróis, pessoas extraordinárias que resolvem todos os problemas. De repente descobri que esses heróis são os nossos vizinhos, pessoas comuns, e que é a exceção que colabora com o todo. É mais fácil nos convencermos de que qualquer ação será complicada ao invés de superar obstáculos. Se o sujeito for cabeça dura o suficiente, e fizer o melhor que pode, a única pessoa que poderá pará-lo é ele mesmo. Temos que nos expor e nos arriscar.

No Brasil, a região sudeste, que normalmente não passa por períodos de seca, está enfrentando uma crise hídrica. O que isso mostra com relação à gestão dos recursos hídricos? É um grande chamado para os cidadãos e as comunidades, seja pelo consumo individual ou por políticas públicas. A crise é para todos, e não só para algumas regiões. Precisamos de soluções, planos, estratégias, para ter certeza que os problemas não vão aumentar. É algo que não depende de apenas uma pessoa, mas de todos os cidadãos.

Quais os aprendizados com a experiência do seu trabalho na África? Temos que focar em sustentabilidade. Percebemos que a comunidade precisa ter autonomia para instalar um poço e manter um comitê responsável pela manutenção, controle, limpeza, entre outros aspectos. Os indivíduos começam a administrar suas próprias economias. Assim, crianças não precisam carregar água nas costas e têm tempo de ir à escola. As mulheres não precisam buscar água e podem trabalhar e contribuir com a renda doméstica. Esse desenvolvimento sustentável começa com a água.

Pessoas que têm água entendem o quanto ela é realmente importante? É fácil nos esquecermos do valor que a água tem. Inclusive, eu me incluo no grupo de pessoas que precisam ser relembradas dessa preciosidade a cada momento de pensar no tempo que levamos para tomar banho ou na água gasta para lavar roupas. Normalmente, as pessoas se dão conta disso quando existe um problema, mas a água precisa sempre ser tratada como prioridade.

Fonte e Agradecimentos: REVISTA VEJA

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