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Melhora em saneamento traria ganhos ambientais

Línguas negras, mau cheiro, proliferação de bactérias e algas. A situação da Baía de Guanabara, bem como das lagoas da Barra e de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, é apontada por especialistas como um dos maiores passivos ambientais da Cedae, que até hoje não conseguiu acabar com o despejo de esgoto in natura nessas áreas. As empresas que assumirem os serviços de água e esgoto no estado, em uma eventual concessão, terão o desafio de transformar essa “herança maldita” em ganhos ambientais para a população fluminense.

Para Paulo Canedo, coordenador do Laboratório de Hidrologia da Coppe/UFRJ, a melhora na eficiência do serviço — com a ampliação da rede de coleta de esgoto e tratamento adequado dos efluentes — pode elevar a qualidade da água dos rios, lagoas e da Baía de Guanabara.

— Há rios muito sujos em todo o estado. O que acontece é que, ao caírem no oceano, os resíduos se dispersam mais. Na Baía de Guanabara, a capacidade de dispersão é um pouco menor e, nas lagoas de Barra e Jacarepaguá, quase nula — explica.

NA BAÍA, FALTAM LIGAÇÕES SUBTERRÂNEAS
Segundo o biólogo e ativista Mário Moscatelli, 49 dos 55 rios que deságuam na Baía de Guanabara “estão mortos”. O mesmo ocorre em sete dos oito rios que abastecem o complexo lagunar da Barra e Jacarepaguá, composto por quatro lagoas principais. Não há estimativas oficiais de lançamento de esgoto em qualquer uma delas. Na Baía, pesquisadores que acompanham a novela de sua despoluição falam em cerca de 18 mil litros por segundo.

— O estado terminal em que se encontram nossos rios, lagoas e a Baía é resultante da falta de prioridade política dada à questão do saneamento. A Cedae nos cobra pelo abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto em uma conta única. Mas não executa o serviço. É um estelionato institucionalizado — afirma Moscatelli.

Nos 64 municípios atendidos pela Cedae, o índice de fornecimento de água é de 93%, segundo a empresa. Já o de tratamento de esgoto é de apenas 30,7%, de acordo com o Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento (Snis).

O programa de Despoluição da Baía de Guanabara — concebido na década de 1990 e cuja execução das obras é de responsabilidade da estatal — avançou parcialmente. As obras de abastecimento de água foram concluídas, mas há pendências nas de esgotamento sanitário: 49% do esgoto na área que impacta a Baía não têm tratamento. Há dez anos, esse percentual chegava a 90%.

— Ironicamente, ao ampliar o suprimento de água, a produção de esgoto aumentou. E as estações de tratamento de resíduos não funcionam a plena capacidade, pois faltam ligações subterrâneas que as conectem a muitas residências dos municípios do entorno — diz Dora Negreiros, membro do conselho da ONG Instituto Guanabara.

LONGO PRAZO
Segundo a Cedae, as estações de tratamento só serão usadas a plena capacidade “num horizonte de 25 anos”. Também é de responsabilidade da Cedae a execução do programa de saneamento de Barra, Recreio e Jacarepaguá. Com duração prevista para 30 anos, as obras começaram em 2001. Apesar dos avanços — o índice de esgotamento sanitário saltou de zero em 2007 para 90% (Barra), 70% (Recreio) e 60% (Jacarepaguá) —, os moradores da região ainda convivem com mau cheiro e lagoas com águas esverdeadas devido à proliferação de bactérias.

A esperança de mudar a situação com a proximidade da Olimpíada caiu por terra. Apesar do compromisso assumido pelo governo estadual de dragar as quatro lagoas principais da região, as ações se limitaram basicamente à limpeza de resíduos sólidos e de manguezais. Segundo a Secretaria de Estado do Ambiente, “intervenções legítimas do Ministério Público” atrasaram o processo e, com a crise econômica, “a realidade mudou”.

O projeto empacado no estado serviu de justificativa à prefeitura do Rio para também não executar sua parte no acordo — a construção de unidades de tratamento em três rios. Segundo a Secretaria Municipal de Saneamento e Recursos Hídricos, a prefeitura só vai honrar seu compromisso “quando o governo do estado fizer a despoluição das lagoas da Barra e de Jacarepaguá”.

Nas cidades onde o sistema de água e esgoto foi privatizado, houve ganhos ambientais, mas a universalização, especialmente no tratamento de esgoto, não foi alcançada em muitas delas. A Águas de Juturnaíba — que abrange Araruama, Saquarema e Silva Jardim e é um braço da Águas do Brasil — tem concessão desde 1998. Com investimento de R$ 200 milhões, a água tratada passou da cobertura de 65% para 97% e a de esgoto tratado, de zero a 71%.

EM NITERÓI, FIM DAS LÍNGUAS NEGRAS
Paralelamente, houve iniciativas de caráter sustentável, como o uso de plantas aquáticas e cascalhos para o tratamento de esgoto, sem uso de químicos. A Estação de Tratamento Ponte de Leites em Araruama é a única na América Latina com capacidade para tratar 200 litros de esgoto por segundo com o sistema, diz a empresa. Em Niterói, a concessionária Águas de Niterói, que pertence ao mesmo grupo e detém a concessão desde 1998, universalizou o abastecimento de água e trata 95% do esgoto. Acabou com as línguas negras em praias como Icaraí e São Francisco, que estavam impróprias há 15 anos.

Na Foz Águas 5, responsável pelos serviços em 21 bairros na Zona Oeste, como Bangu, a cobertura de tratamento de esgoto cresceu seis vezes desde 2012, mas ainda está em 30%. Foram criados dois mil empregos diretos e indiretos.

Moscatelli enfatiza que não adianta melhorar o serviço de coleta se não houver, em paralelo, um planejamento que impeça o crescimento desordenado das favelas. Isaac Volschan, da Escola Politécnica da UFRJ, alerta para a importância da regulação, de forma que metas possam ser monitoradas. A Cedae, diz, só passou a ser regulada em 2015, pela agência estadual Agenersa.

— Independentemente de qual seja o modelo de participação do capital privado, é preciso deslanchar a regulação — diz Volschan.

Fonte: O Globo

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