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Destino do lixo eletrônico vira um desafio planetário

Pesquisa do Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento mostra que só 724 cidades no Brasil têm algum tipo de coleta de lixo eletrônico.

O celular, o computador, qualquer equipamento que leve ao mundo virtual, fica velho um dia e vira lixo. E o destino desses resíduos virou um desafio planetário. Veja na matéria do JN por que o Brasil ainda não consegue reciclar o lixo eletrônico em larga escala.

A reportagem mostra uma empresa que poderia ser chamada de “desfábrica”. Especializada em desfazer, destruir, dar um fim seguro a aparelhos defeituosos, ou usados, enviados por indústrias, redes de lojas, tudo que se possa imaginar.

A empresa, no interior de São Paulo, também seleciona no meio dos destroços uma série de materiais que podem ser reciclados.

No caso de alguns equipamentos, o reaproveitamento chega perto de 100%. É o caso das maquininhas de cartão de crédito. A empresa recebe, por semana, cinco toneladas delas. Um trabalho de alta responsabilidade, não só pela questão ambiental, mas pelas informações que elas contêm. Ou continham, antes da destruição, que é feita imediatamente. Tudo altamente controlado. Mas empresas como esta ainda são poucas no Brasil, e concentradas no estado de São Paulo.

“Fora de São Paulo, não existem empresas pra receber esse tipo de material e fazer o descarte correto dele. Então provavelmente está havendo o descarte inadequado”, afirmou Johnny Alves da Silva, gestor técnico operacional da empresa.

Pelo último levantamento do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, só 724 das mais de 5.500 cidades brasileiras têm algum tipo de coleta de lixo eletrônico. E não é por falta de lei: lançada há cinco anos, a Política Nacional de Resíduos Sólidos prevê a implantação da logística reversa, em que importadores, fabricantes, distribuidores, comerciantes e consumidores devem promover a coleta e a destinação correta de uma série de produtos.

“A Política Nacional de Resíduos Sólidos é relativamente avançada, acontece que para a regulamentação da lei nós precisamos dos acordos setoriais”, disse Tereza de Brito Carvalho, coordenadora do Laboratório de Sustentabilidade Poli/USP.

Fazer esses acordos com cada setor não é tarefa simples: para começar, a indústria eletroeletrônica se divide em várias linhas: a branca, de geladeiras, fogões, lavadoras; a marrom, de TVs, câmeras, DVDs. Eletrodomésticos como liquidificador e forno elétrico compõem a linha azul. Na linha verde, computadores, impressoras, celulares.

O caminho de volta dos equipamentos descartados tem uma série de obstáculos: o tamanho do país encarece o transporte até os centros de reciclagem. A cobrança de impostos em sequência, ao cruzar estados – alguns até proíbem a passagem desse tipo de material; a definição do que é carga perigosa, que exige veículos e licenças especiais, é outro problema. Um celular descartado, por exemplo: quando ele passa a oferecer algum tipo de risco?

“Ele não é diferente daquele celular que você utilizava, cinco minutos antes de ele quebrar. Se o produto, resíduo eletroeletrônico ou produto fora de uso for classificado como perigoso, você tem um problema, que é toda a burocracia ambiental que vem por trás desse processo. Um ponto de coleta de recebimento de equipamentos usados em lojas, por exemplo, pontos comerciais, acaba se inviabilizando, porque você vai ter que ter um licenciamento ambiental daquele ponto”, afirmou João carlos redondo, diretor de sustentabilidade da Abinee.

Outra discussão é sobre quem deve se responsabilizar pelos computadores da chamada linha cinza. Aqueles sem origem definida, montados com peças de diversas procedências. E ainda: como enquadrar todas as importadoras, responsáveis por 23% do mercado nacional? Muitas não integram nenhuma associação. Não seriam atingidas por acordos setoriais.

“Eu acho que nós conseguimos, não até o final desse ano, conseguimos até o ano que vem assinar um acordo setorial e dar início à logística reversa de eletroeletrônico”, declarou Zilda Faria Veloso, diretora de ambiente urbano do Ministério do Meio Ambiente.

Um ponto fundamental a ser definido é como financiar o sistema. O custo, só para a linha de computadores, é estimado em R$ 80 milhões por ano. Existe a ideia de criar uma taxa específica para isso.

“Na União Europeia, ou em países como o Japão, existe sim uma taxa que o consumidor, no momento da compra do produto, ele tem um valor destacado em nota referente à logística reversa daquele produto quando ele for descartado”, afirmou João Carlos Redondo.

O pesquisador Luis Peres Azevedo, da Universidade Federal de Ouro Preto, discorda. Ele acaba de concluir um estudo que mostra que a logística reversa pode dar lucro – pelos cálculos dele, R$ 11 mil por tonelada de material processado.

“Eu não vejo por que o consumidor, que já está pagando uma taxa de impostos elevada, ainda ser onerado com mais uma taxa pra recolher algo que ele usou e que era de interesse do fabricante vender”, disse o engenheiro eletricista Luis Peres Azevedo.

Em Sorocaba, no interior paulista, um exemplo isolado do que deveria ser regra geral. A fábrica de computadores tem uma outra unidade, ao lado, dedicada exclusivamente à desmontagem e reaproveitamento de equipamentos da marca. O plástico é picado, derretido e remoldado em peças para novos equipamentos.

Uma máquina importada da Alemanha tritura as placas de computador e já separa os pedacinhos em três categorias, de acordo com o valor dos metais presentes neles. Mil toneladas de equipamento passaram por ela, no ano passado – mas elas representam só 8% do que a empresa poderia receber de volta.

“Ainda é pouco, e olha que hoje nós temos 400 pontos de coleta ao longo do Brasil pra devolução de equipamentos. Ainda assim, o retorno é pequeno perto do que poderia ser”, afirmou Paloma Cavalcanti, gerente de Sustentabilidade da HP.

Mas, o que fazer quando não há onde entregar aquele aparelho velho, ou mesmo quando não existe um lugar apropriado para ele?

“Hoje eu não tenho um acordo setorial, e não tenho ainda como dizer ‘olha, entrega o seu celular em tal lugar, entrega a sua televisão em tal lugar’. Se nós formos indicar isso para o consumidor, o consumidor antes de jogar qualquer um desses produtos sujeitos à logística reversa fora, procure informações – ou na prefeitura, que tem essa informação, ou em grandes redes, como supermercados, grandes lojas de material de construção ou o próprio fabricante”, afirmou Zilda Faria Veloso.

Fonte: G1

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